Por Marcos Nogueira
Os barracos do Leblon e dos Jardins –os playgrounds dos ricos do Rio e de São Paulo, respectivamente– nos ensinaram algo importante no fim de semana que passou.
A lição: com ou sem pandemia, a elite brasileira é selvagem demais para frequentar restaurantes. Não tem o mínimo senso de comunidade. Esta é uma sociedade podre.
Ninguém tem razão nesses vexames –“barraco” é um eufemismo condescendente. Examinemos os personagens de cada episódio.
No Leblon, um indivíduo que se gaba de sair com duas mulheres ao mesmo tempo desfila com a dupla, num carro conversível, na rua Dias Ferreira. Claramente uma atitude de playboy microcéfalo.
No vídeo que circula nas redes sociais, não aparece nenhuma cena de filme pornô ou algo assim. Apenas uma mulher de biquíni –que a paisagem carioca incorpora até ao metrô e à padaria– empoleirada na traseira do carro.
Tem também uma música alta que parece vir do Peugeot do gostosão do Leblon. Uma cena explícita de exibicionismo e incivilidade. Eu ficaria com raiva se estivesse na calçada. Incomoda. Dá ódio. Já falei que irrita?
Mas o que se pode fazer a respeito? Chamar a polícia não adiantaria. O jeito era esperar uns minutinhos até o Trio Los Angeles sumir do campo de visão.
Só que surge uma cliente do restaurante Togu, indignada em demasia com a perturbação da ordem e do sossego. Ela passou a atirar tralhas nas pessoas do conversível. A vítima se converteu em agressora e –veja só as reviravoltas da trama– e depois em agredida, pois levou um tabefe da garota que atacava.
Galopando por entre as mesas na calçada, aparece um figurante com ganas de roubar o show: um rapaz valente, que aborda o trio para arrancar a parte de cima do biquíni da moça pugilista.
A mulher de bem que atacou os exibicionistas cometeu um lindíssimo ato falho no vídeo que gravou para justificar a agressão. Ela diz: “Infelizmente, nós vivemos numa sociedade.”
Só gente fina no Leblon. Vamos aos Jardins.
No Gero, um dos restaurantes da grife de luxo Fasano, um cliente insiste em ser atendido apesar de ter chegado pouco antes das 22 horas, quando o fechamento é obrigatório pelas regras de exceção na pandemia.
O cliente não era um cliente qualquer –era sócio de outra rede de restaurantes de luxo, o Rubayiat– e não arreda pé. Diz que vai chamar “o meu delegado” para resolver o impasse.
Já na rua, começa a bater boca com outros indivíduos de sua casta. A conversa, ainda que exaltada, se arvora em argumentos como “eu tenho berço” e “educação europeia”.
Completa o quadro o elenco de apoio dos dois episódios, formado pelos frequentadores de ambos os restaurantes, com celulares em punho para registrar o forrobodó e comentários do nível de “piranha!” e “não tem berço não”. Máscaras se veem somente nos garçons do Gero.
Ninguém se salva no incêndio do parquinho.
FOLHAPRESS